terça-feira, 5 de agosto de 2014

Gantz – Veja além dos tiros e sangue


Vivemos em um mundo incrivelmente violento. Guerras, rumores de guerras, homicídios, brigas, acidentes, destruição, fogo, fumaça, lágrimas de dor pelas perdas de pessoas queridas... Basta ligar a TV, ler um jornal na banca ou entrar em sites de noticias para encontrar relatos sobre tragédias. A imprensa fala sobre determinado fato com muita repetição, causando crise e histeria popular. Pare para pensar por um instante: qual seria o motivo de viver nesse lugar?  Se sente motivado a continuar aqui? O que te prenderia nesse mundo?
Basta lembrar que boa parte das pessoas reclama da violência do mundo, mas aceitam entrar em sites que mostram gente morta, com cenas horripilantes. Tem gente que reclama das roupas usadas por algumas mulheres, mas buscam diversão vendo sites e revistas pornográficas, exaltando a luxúria. Nosso mundo vive uma crescente linha de hipocrisia. Mas ainda existe beleza nele. Apesar de vivermos num mundo corrompido, não precisamos nos corromper nem nos associar ao que é feito de mal. Ainda existe bondade no ser humano. Creia nisso.
Em Gantz temos a história de Kei Kurono, um rapaz que mora sozinho e que freqüenta normalmente a escola. É extremamente pervertido, chegando ao ponto de imaginar cada menina da sala nua até mesmo a professora, causando constrangimento em cada vez que é avisado que está “animado demais” e que precisa se controlar. Sua vida é pacata e sem muitas emoções até um dia em que no metrô vê um mendigo caindo nos trilhos. Como ninguém se prontifica a ajudar, Katou, um amigo de infância pula dentro dos trilhos e tenta puxar o homem para fora, mas sem sucesso. Ninguém que vê a cena se prontifica a auxiliar até que Kurono a contragosto  decide descer.  Com muito esforço eles conseguem salvar o mendigo, porém não conseguem fugir do trem que se aproxima e na frente de todos, são esmagados e mortos.De repente os dois são transportados para dentro de um quarto com outras pessoas que aparentemente também já estão mortas, sendo que no meio desse cômodo  está uma grande bola negra. As pessoas se mostram assustadas, não sabendo ao certo o que está ocorrendo, pensando que tudo aquilo era um sonho. Mas não, todos ali estão de fato mortos e agora terão que jogar um jogo que Gantz, a bola negra, propõe. Fica claro logo de cara que Gantz tem a vida deles nas mãos e que a partir daquele momento ele faria com eles o que bem entendesse.
É dito a eles que eles à medida que jogarem os jogos poderão ter uma esperança de voltar para casa, se alcançarem certa pontuação. Aquilo tudo é confuso e fora do normal. O que é a morte? Um jogo? Dá pra voltar? Essas perguntas ressoam nas mentes de cada um que está na sala. É dado para cada pessoa um traje preto especial, uma espécie de uniforme para  se protegerem além de contarem com armas e GPS.

Ao serem transportados para o campo de batalha, terão que eliminar aliens, no começo frágeis e até com aparência infantil, porém, os desafios aumentam e muitos jogadores são eliminados. Para os sobreviventes, fica a impressão que aquilo tudo é muito doentio e confuso. A competição pela sobrevivência é o tema da missão onde terão o tempo de uma hora para completar. Gantz mostra muito pouco sobre o inimigo claramente escondendo coisas muito importantes. Após a missão concluída, com muitas baixas, Kurono, Katou e a garota de seios fartos, Kishimimoto conseguem voltar para casa, mas é apenas o começo. Muitas outras missões e desafios estão reservados para eles e para aqueles para quem a morte chegar. Acabando esse primeiro estágio, são transportados para suas casas como se nada acontecesse. Mas a qualquer momento poderiam regressar...
Kurono volta a ir ao colégio, mas não sabe ao certo o que houve, se tudo que viveu era ou não um sonho. Mas ao ver a roupa e as armas no seu quarto, percebe que não. Com o tempo se vê apaixonado por Kishimimoto e realmente esse sentimento cresce quando ela vai morar em sua casa. Katou, por outro lado, se preocupa por seu irmão e o protege de quaisquer maus tratos de seus familiares. E não protege somente ele, mas qualquer garoto que na escola seja ameaçado por qualquer valentão. Aos poucos esses três personagens viverão intensas emoções, envolvendo sentimentos de amor, ciúmes, admiração e coragem. O roteiro que ao começo parecia raso e confuso se torna um carrossel de instabilidade emocional. Kurono, aquele moleque imaturo e pervertido no começo transforma-se num exemplar jogador manuseando muito bem as armas e sendo um estrategista. Creio que os cenários forçados de guerra e morte contribuíram para o endurecimento de seu caráter. Katou e Kishimoto são essenciais na trama, mas é muito difícil não se emocionar com tudo que vivem e o que representam dentro da história, onde seus destinos se cruzam e laços mais fortes são feitos. Kurono se torna um líder, carregando em seus ombros a obrigação de orientar e cuidar para que todos voltem para casa sempre e que ele mesmo consiga ir atrás de seus sonhos. Katou pensa muito em seu irmão e busca nesses jogos proteger a cada um dos outros jogadores contra as ameaças que aparecem. Essa dedicação é algo belo e sincero, algo que poucas pessoas no mundo fazem: se preocupar com o próximo sem querer absolutamente nada em troca.
Gantz é um anime com alto apelo sexual, muito violento, perturbador e sanguinário. Há cenas cruéis que incluem tiros, assassinatos, membros sendo arrancados, gritos, dor, agonia, sadismo e muitas lágrimas. Uma das cenas mais tristes e dolorosas para mim foi uma na qual um dos melhores jogadores morre de uma maneira muito triste, chamando sua mãe, pedindo para que ela a cubra pois ele está  sangrando e ferido e está com muito frio. Devo dizer que me deu um nó na garganta. A sensação de ver seus amigos serem mortos, a agonia, a dor, a saudade, a decepção de ter sonhos quebrados transformam Gantz numa obra que vai muito além da violência exposta. Aqui não há perdão, você fica distraído e tem a cabeça estourada por um tiro, ou simplesmente pode explodir ao cair em alguma armadilha. Gantz não aceita perder, não quer perder e por melhor que seja o jogador, ele não vai conseguir entender como jogar o jogo o tempo todo, sem que fique tenso.  
Creio que a grande mensagem da obra de Hiroya Oku vá além dos confrontos de personalidade dos adolescentes ou mesmo das cenas de violência explícita. O grande mal no mundo, como mostrado em Gantz, não são alienígenas, monstros ou guerras. O grande mal no mundo é a maldade do ser humano que não se preocupa em ferir e magoar que quer que seja para satisfazer seus apetites por poder. Apesar de tudo que é ruim que existe ao redor, esse mundo possui valores que não podemos viver sem,  como o amor,  a amizade, a família, a natureza, uma boa música, um sorriso de uma criança. Isso tudo é belo e merece nosso tempo. Aquele abraço gostoso da mãe, namorada ou irmão. Isso faz muita falta. Principalmente quando a morte chega. Ter na lembrança que esses momentos não irão voltar. E você fica ali, na janela da casa, esperando ver aquela pessoa de novo, chegando em casa depois da escola ou do dia do trabalho. Mas ela não vem mais, nunca mais. E ali, na janela, você se dá conta de tudo que poderia ter feito e não fez. O que poderia ter dito e  feito.

Apresse-se, corra, enlouqueça, viva a vida. Não deixe a morte chegar sem viver a beleza da vida. Repito: esse mundo é lindo e estar nele é uma vitória, mesmo com tudo de mal que nos sufoca. Essa é a grande mensagem de Gantz: VIVA!

Nenhum comentário:

Postar um comentário